Um ano após a sua estreia comercial nas salas, O Casarão, de Filipe Araújo, chega esta semana ao mercado do DVD numa edição especial com conteúdos exclusivamente produzidos para o disco. Os testemunhos inéditos de João de Melo e Frei Bento Domingues, antigos ex-seminaristas na instituição objeto da obra, são duas das novidades do suporte
Um velho casarão apodrece no coração de uma aldeia rasgada ao meio por uma estrada onde os carros já não param. O realizador Filipe Araújo quis desvendar os mistérios por detrás do antigo epicentro da terra – o mais progressista seminário católico português durante a ditadura, que, quase meio século depois, aspira a uma segunda vida. O Casarão foi o filme que nasceu desta sua pulsão e que chega agora em versão DVD numa edição especial que inclui cenas cortadas, uma entrevista com o autor e testemunhos inéditos do romancista João de Melo (autor de “Gente Feliz com Lágrimas”) e do pensador e teólogo dominicano, Frei Bento Domingues, ambos ex-seminaristas daquela instituição.
O filme, que está já disponível para compra na loja do site da Zero em Comportamento, e no início do ano chegará às FNACs, Cinemateca Portuguesa e outras lojas especializadas espalhadas por todo o país, desvenda o papel que o antigo seminário dominicano de Aldeia Nova teve nas vidas dos muitos rapazes que passaram pelas suas salas e corredores, e o destino que agora poderá ter.
No curso das ditaduras do século XX e da ressaca das Grandes Guerras, o acesso ao conhecimento sistematizado para os estratos baixos da sociedade e nos contextos rurais, onde se encontrava o grosso da população, era praticamente nulo.
Havia, contudo, duas exceções: a oferecida pela profissionalização militar e a via religiosa — encaradas como um dos raros passaportes para uma vida melhor. Foi esse o caminho percorrido pelo pai de Filipe Araújo, professor universitário e investigador científico. Nascido no seio de uma aldeia minhota, foi o único dos cinco irmãos a seguir os estudos. Conta que o fez aliciado pelo prior da terra, que lhe acenou com as mais excitantes disciplinas do saber, apresentando-lhe a vocação religiosa como um “dom para melhorar o mundo”. Tinha 10 anos quando ingressou no seminário de Aldeia Nova.
“A premissa deste projeto nasce da vontade de colocar em diálogo dois Portugais separados por um intervalo de meio século e ligados através de um mesmo edifício. É, portanto, um filme sobre finais de ciclo, mas também sobre um paradoxo. No caso, o paradoxo que é, em plena ditadura salazarista e num lugar carregado de isolamento, a “descoberta da liberdade” por parte de um grupo de pré-adolescentes a preparar-se para algo que nunca viria a ser”, explica Filipe Araújo.
Para o realizador, este documentário constituiu uma oportunidade de levantar o véu não apenas sobre um imóvel com história caído no esquecimento, como também sobre a improvável experiência feliz de mais de uma centena de vidas construídas entre dois mundos: o secular e o religioso.
Com esse propósito, O Casarão convida-nos a acompanhar a passagem de testemunho do antigo seminário através de António, caseiro do edifício desde o tempo dos padres, recuperando paralelamente as memórias dos seminaristas por intermédio de cartas, diários e textos dispersos entretanto reunidos.
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